Prologues

em quarta-feira, 10 de outubro de 2012 |


Prólogo I

Avaliava o rosto de cada pessoa que passava por mim enquanto descia a longa rua. Expressões irritadas, alegres, apaixonadas, frustradas, tristes... na verdade, eram mais expressões negativas do que positivas. Mas isso não me surpreendeu.

Passei por uma montra e sem me aperceber, parei a observar-me. O meu reflexo ficara perfeito no vidro espelhado. Eu devia saber, mas quem era aquele ali? Levei tempo para perceber que isso não importava, eu era apenas mais uma expressão negativa.

Um rosto cansado, olhos negros e inchados, um porte visivelmente esgotado, rugas. Oh… quem é que me daria os 23 anos que tinha? Ninguém. Eu aparentava ter uns 30, dada a minha aparência. Eu parecia um bicho.

Abanei a cabeça e continuei a minha caminhada, assustado com a realidade. Em quê que eu me tornara? O que era eu agora? Um homem sem motivo para ser, um homem sem qualquer vontade de acordar e viver, como sempre fazia, feliz.

Olhei o céu em cima. Era noite e a lua estava ali. Suspirei. Desde que a minha mãe faleceu, a minha vida virou um inferno, sem tirar, nem pôr. Agora eu tenho um homem que se diz ser meu pai, mas que de pai, não tem nada. É um homem que não merece nem o ódio que eu tenho por ele. Um homem que merece estar morto.

Mais um motivo para a minha revolta com tudo o que nos rodeia. Porquê a minha mãe e não aquele homem? Porquê alguém que merecia viver? Porque ela teve que partir e deixá-lo ficar? Eu nunca entenderia.

Mas o mais importante de tudo, a única coisa que me fazia estar ali, erguido nas minhas fracas pernas, era a mulher da minha vida. A única mulher que me fazia viver, lutar e dar o melhor de mim para fazê-la ter a melhor vida possível. O meu anjinho, Caroline.

Ela tem 7 anos e é por ela que eu estou aqui. É por ela que caminho para o meu trabalho que me obriga a esforçar-me como nunca antes. É por ela que eu acordo pela manhã, para ver o seu sorriso e sentir a sua presença, comigo. É por ela que enfrento o homem que a quer tirar de mim, todos os dias. É por ela que eu vivo.

Encarei a rua à minha frente. Eu podia ser um homem perdido, um homem sem motivos para ser feliz. Um homem que odiava o seu “pai”. Um homem sem uma história romântica com uma mulher lindíssima. Um homem sem interesse.

Mas eu seria um homem que lutaria até não aguentar mais estar de pé pelo bem de quem amava. Isso era a minha vida. A minha luta.



Prólogo II

Parecia impossível pensar que, mesmo passados dois anos, a minha vida continuava na mesma. Haviam acontecido inúmeras coisas, umas boas, outras más, mas nem por isso eu mudara radicalmente.

Talvez olhando para trás eu me desse conta do quanto poderia ter aproveitado aquela oportunidade, do quão burra havia sido quando desprezara os cuidados das duas únicas pessoas que algum dia me tinham tratado com… Respeito, sim, penso que fosse esse o sentimento.

Faziam precisamente dois anos que conhecera Doug, naquela noite. E deixando a minha cabeça vaguear pelo passado, eu percebia que pouco ou nada me havia servido o pouco tempo que passara na sua companhia e na de Lois. Não me surpreendia em nada que as coisas não mudassem, não melhorassem para mim. Toda a vida eu soubera apenas dar cabo de tudo. Era uma completa falhada. E sabia-o.

Aquele homem tinha sido, em 16 anos, o único que chegara a ver-me como mais do que uma simples e reles prostituta. O único que me ajudara quando mais havia precisado, que me havia tratado quase como a uma filha. Como se houvesse sido o pai que eu nunca tivera. E ela, Lois, também me ajudara imenso.

Pensar neles fazia-me sorrir por minutos enquanto me olhava ao espelho. Dava-me conta de que, mesmo tendo atingido a maioridade, poucas diferenças se notavam em mim, na minha expressão, nos meus olhos. Ao aperceber-me dessas totais semelhanças com o passado, o sorriso desvanecia-se por completo. Dava lugar à agonia. Ao arrependimento.

A vida em Vegas não tinha sido das mais fáceis. Mas mesmo assim, eu aguentara durante uns tempos. Estava habituada a dificuldades, uma vida perfeita era algo que nunca havia tido, excepto durante as semanas em que tive Doug e Lois comigo. Porque eles tratavam de mim. Porque eles me davam o amor que eu nunca havia tido, de ninguém.

As lembranças assaltavam-me, de vez em quando, a caminho da boate ou quando chegava a casa. Quando via as roupas que eles haviam comprado para mim. A mala que Doug me deixara e que eu passara a usar todos os dias. Às vezes, ainda lhes ligava. E passava horas ao telefone com Lois a falar de coisas de mulheres. Evitava falar do meu trabalho. Mentia-lhes, dizendo que decidira mudar e ter uma vida decente. Mas, no fundo, tinha a certeza de que ela me conhecia o suficiente para saber ser mentira, que apenas tentava sossegá-la. Eu tinha saudades, não havia como negá-lo. Estava habituada a mentir em muitas coisas mas nisso era-me impossível fazê-lo.

Eles sabiam que eu teimaria até ao fim. Não precisava de ninguém. Não era a filhinha de ninguém. Ultrapassara dez anos a fio da minha vida sozinha e iria continuar a fazê-lo. Às minhas custas, fazendo o que fosse preciso para sobreviver. Como sempre fizera até ali.

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