Chapter Eight

em quarta-feira, 10 de outubro de 2012 |

Acabava de me vestir e encarar o espelho. Nele, não via nada reflectido além do rosto e corpo de uma vadia miserável, uma criatura desprezível e mais do que dispensável a toda esta merda de mundo, nesta altura do campeonato.

Suspirei, antes que as imagens da noite anterior me assaltassem a cabeça. As palavras ditas naquela promessa tinham-me ficado mais do que gravadas na memória e teimavam em não sair. Será que ele viria mesmo?

Não, eu não podia meter uma coisa dessas na ideia. Ele não vinha. Eu tinha a certeza disso. Ele tinha-se divertido com a Sheila depois de me ter deixado no quarto e… ai… que raiva…

Levei as mãos ao cabelo para tirar a franja dos olhos e dei uma última passa no cigarro, antes de o apagar. Deitei a beata no cinzeiro e olhei-me no espelho uma última vez antes de sair porta fora, descendo as escadas para ir ter com Tessa ao balcão.

Haviam já alguns clientes presentes, mas não liguei. Ao contrário do que costumava fazer todas as noites virei costas aos homens que nos olhavam, apoiando-me com os braços no bar para tentar recuperar a calma. Ainda pensava nele. Que raiva que me dava não conseguir tirar semelhante pessoa da minha cabeça.

- Estás bem? – A voz de Tessa chegou mais perto e arrancou-me aquele disparate da mente. Acenei simplesmente.

- Sim.

- Se vires que não estás em condições vai para casa.

Acenei de novo. Casa? O que era isso? Adiante… ela não sabia, ninguém sabia e ninguém ia saber. Nem que eu ficasse hospedada na rua ou escondida num dos quartos da merda da boate mas ninguém ali teria pena de mim. Nunca.

Dei um sorriso leve.

- Não. Eu estou bem.

Foi a vez dela de proferir um aceno de cabeça, dando uma última esfrega ao copo que limpava. Vi-a olhar em frente, em seguida. Sorriu, de súbito.

- O teu amigo chegou. – Disse-me, em voz baixa, aquele sorriso perverso habitual no seu rosto. Não percebi aquele comentário. Pelo menos, até olhar para trás e o ver.

Ele… tinha vindo. Cumprira a promessa. Ele viera… ver-me?

O meu coração bombeou, de repente. As pernas tremeram. Foi uma reacção estranha para a qual não consegui encontrar qualquer tipo de explicação.

Ele… tinha mesmo vindo. E agora? Que fazia eu?

Vi-o fazer-me sinal e, imediatamente, as minhas pernas seguiram na sua direcção. Via-o sorrir à medida que me saía de trás do balcão para me aproximar e quando parei à sua frente para lhe falar.

- Olá. – Disse, simplesmente.

O sorriso dele pareceu crescer, antes de eu sentir o toque vibrante da sua mão na minha. Voltei a tremer. A sentir arrepios.

- Olá… eu… prometi que vinha.

Sim, ele prometera. Antes de sair porta fora, de vir embora e… de eu o ver com Sheila. Prestes a enrolarem-se os dois num quarto qualquer. Mas também… para que queria eu saber disso?

Imediatamente, a raiva me fez ter o impulso de soltar a mão da sua. E um buraco pareceu abrir-se no meu peito mal o fiz.

- Como estás hoje?

Ele não desistiu. Voltou a pegar a minha mão sem pedir licença, fazendo regressar os arrepios ao meu corpo à medida que os seus dois polegares se movimentavam circularmente na palma dela. Contive a vontade de fechar os olhos e deixar-me levar. Desde quando eu gostava de ser tratada assim?

A questão era essa. Eu não gostava. Não podia gostar. Nunca poderia fazê-lo. Eu era o que era, ele não podia fazer-me mudar. Ninguém podia.

- Bem. – Voltei a afastar a mão, o meu tom de voz soando demasiado frio. – O que é que queres?

Tive de perguntar aquilo. Queria esquecer que ele havia dito que voltaria por mim. Eu não sou razão para ele ter de fazer nada. Para ninguém ter de fazer nada.

- Um quarto contigo. É o que eu quero.

Vi-o levantar-se, ficando perto o bastante de mim para que tivesse vontade de fraquejar, de saltar para os seus braços.

Olhei-o nos olhos, apenas. Não percebia onde ele queria chegar. Será que tinha acordado e percebido que a única forma de ter algo comigo seria ali? Naquela boate imunda e estúpida? Ora… acorda Mallory… como se alguma vez ele fosse querer algo a sério…

- E para quê?

Não sei sequer porque me dera para perguntar isto. Simplesmente dera. Eu sabia a razão. Mas acho que… tinha esperanças, ainda. Esperanças completamente inúteis. Mas tinha-as.

Ele riu-se. E eu fiquei a pensar… qual seria a merda da piada, afinal?

- Falar contigo. – Não. Ele só podia estar a gozar! – A não ser que me ataques.

Na verdade, era precisamente aquilo que eu tinha vontade de fazer. Atacá-lo. Bater-lhe. Muito. Ele era tão mas tão idiota. Permaneci séria, calada. Tive várias coisas a assaltarem-me a ideia na altura mas… a maior delas era que… ele tinha voltado. E apesar de dizer que queria apenas falar comigo eu sabia que ele o tinha feito pelo mesmo motivo que todos os outros. Ele desistira, simplesmente, de me tratar como o que eu não era.

- Vamos, Mallory.

Ele voltou a pegar na minha mão e puxou-me escadas acima. E enquanto subia cada degrau sentia-me mais perto da tortura. Afinal… o que é que eu queria dele? E ele de mim? O que raio era isto, que merda?!

Entrámos no mesmo quarto da noite anterior. Dei uns passos, ainda pensativa. Encarava o chão, tremia, recuava. Eu… estava a fugir dele? Mas porquê?

- Tens medo de mim, é?

Aquela pergunta soou a um certo desafio. Eu não tinha medo de nada. De ninguém. Muito menos de um menino da mamã como ele.

Levei as mãos atrás das costas, começando a desapertar o sutiã. A reacção dele foi instantânea, quase de receio. Mas o ar com que me olhava mostrava outra coisa diferente: Desejo. Puro desejo. Porque é que os homens eram uns trastes tão básicos?

Devolvi-lhe o mesmo olhar que me lançara. Para quê ter medo dele? Para quê recuar? No fim, terminava sempre da mesma forma, comigo a gemer debaixo deles e a receber pelo serviço ao início da manhã. Para quê fugir à merda de destino traçado que eu já tinha?

Mas então… ele segurou as minhas mãos. Fez-me parar. E eu vacilei.

- Eu não quero… assim não.

- Mas… porquê? Não te dou vontade? Não sou boa o suficiente para ti, é isso?
Não era. Não o era… para ninguém.

E, subitamente, foi ele que mudou. Quando me senti de costas para aquele tronco dele, sentindo o quão bom ele estava, o quão dura aquela parte dele ficava quando estávamos perto, eu… oh, meu Deus, ele matava-me!

- Achas que não és boa o suficiente? Hm? – Sussurrou ao meu ouvido.

Tive vontade de gemer ali mesmo. Fechei os olhos tomada pelo tesão que ele me dava e senti o lábio inferior doer quando o mordi com força.

- Prova-mo então. Prova.

O meu corpo colou-se ao dele mal aqueles lábios gostosos atacaram os meus. A sua mão esquerda descia pelo meu tronco, encontrando o meu rabo até o apertar para nos juntar mais, enquanto a direita se fechava em punho entranhando-se nos meus cabelos. As nossas bocas devoravam-se de uma forma gulosa, demasiado intensa.

Quando senti as mãos dele pegarem-me, cedi ao impulso de deixar que as minhas pernas se enrolassem na sua cintura. Sentia o seu sexo cada vez mais erecto… cada vez mais quente e pronto para mim. Os seus passos levaram-nos até à cama e deixaram o meu corpo cair, sem que os nossos lábios se desgrudassem um só momento.

Toda eu tremia enquanto ele me tocava. Enquanto aquelas mãos me tomavam, enquanto aquela loucura toda se apossava de mim. Enquanto a sua boca passava a devorar o meu pescoço, mordendo-o sedutoramente. E eu gemi. Alto. Mostrando que o queria. Mais. Mais e mais. Todo. Por inteiro. Em mim.

Só que acabou.

E quando ele se afastou… não sei explicar porquê… mas qualquer coisa em mim… doeu.

- Eu não vou foder-te numa cama destas. Aliás, eu não vou foder-te.

Foi como se eu tivesse sido pisada. Uma. Duas. Três. Infinitas vezes. E mesmo assim continuasse a deixar-me pisar. Era burra mesmo! Estava mais que na cara que ele não me queria. Então porque continuava a procurar-me? Porque é que fazia com que eu me humilhasse assim? Era alguma fantasia estúpida dele? Deixar-me louca e depois dizer que não? Que não?!

- Eu já te disse que não fodo ninguém por foder. Só eu sei o quanto me controlo para me afastar de ti. – Não fui capaz de olhar nos seus olhos quando ouvi aquelas palavras. – Quando eu te tiver… eu vou fazer tudo o que nenhum fez contigo, isso é uma promessa.

O sentimento de raiva profunda acabara de voltar. Ele mentia. Mentia porque se me quisesse de facto teria aproveitado qualquer das ocasiões para me ter. Nunca me afastaria daquela forma, não seria capaz de fazê-lo. Começava a fartar-me que ele brincasse com o que eu sentia… mas que raio, que merda é que eu estava a sentir? E porque é que era tão forte a ponto de me dar cabo das ideias?

- Olha para mim, Mallory. – Senti as suas mãos agarrarem nos meus braços e prenderem-nos acima da minha cabeça. – Olha e diz se não vês o que eu quero, diz se não vês o quanto eu te quero… diz.

- Larga-me.

Punha-me furiosa o facto de eu me estar a conter tanto. Mas não ia chorar. Não por ele nem por cabrão de homem nenhum. Eles não passavam de animais, não mereciam nada. E eu podia ser só uma qualquer mas não ia rebaixar-me mais às humilhações dele. Nunca mais.

- Não. Não vais sair dos meus braços até entenderes que eu quero tudo contigo. Mas fora daqui. Longe desta merda! Puta que pariu, queres que eu faça mais o quê?

Que sacana aldrabão! Filho da puta miserável!

- Vais dizer o quê? – Gritei a plenos pulmões. – Que desde que saíste daqui não me tiraste da cabeça, que queres ficar comigo para sempre, é isso? Que te apaixonaste loucamente por mim? Eu não caio nessas merdas!

- Não! Vou dizer que sonhei que estava contigo. Vou dizer que me lembrei de ti quando vi uma mulher de cabelo castanho avermelhado, ou olhos verdes, lindos. Vou dizer que não consigo decidir se me controlar e agir correctamente é a melhor forma de te ter – Vi o seu rosto aproximar-se do meu. – E vou dizer que… passei o dia a pensar como será estar apaixonado por ti.

Quando ele sussurrou aquelas palavras… senti as lágrimas aproximarem-se. Mas palavras eram apenas isso: Palavras. Não passavam essa categoria.

Encarei-o durante uns momentos antes de ter de desviar o olhar, não suportando a ideia de ele poder ter dó de mim.

- Vai-te embora…

- Queres mesmo que eu vá? Mallory… porque não me deixas passar essa tua capa? Sou assim tão mau para não me quereres por perto, é isso? – Ergui os olhos na direcção dos seus, novamente. Os seus lábios moviam-se para falar praticamente contra os meus.

Não evitei fechar os olhos. Como é que eu lutava contra o que estava a sentir, como é que se afastava alguém que… se ama? Como?

Que estupidez… eu devia estar doida para sentir aquilo. Era o mais certo.

- Por favor… – Voltei a pedir.

- É isso? Não me achas bom o suficiente para te ter fora desta merda? Se for isso… diz. Por favor.

Tremi de novo com a proximidade do hálito dele. Daquela boca que eu queria que fosse minha. Quando ele roçou aqueles tecidos doces que eram os seus lábios pelos meus foi como se…

Eu queria beijá-lo. Tanto. Queria poder abraçá-lo. Implorar-lhe que me quisesse, que me tirasse dali. Que me salvasse. Mas… nunca poderia fazê-lo. Ele não merecia isso, não merecia ter de ficar preso a mim. Eu não o merecia.

Não falei. Tive medo de vacilar e chorar. Não conseguia abrir os olhos. Por que raio doía assim tanto?

Eu queria. Muito. Mas só conseguia… conter-me. E estava a conter-me tanto. Porque é que eu não estava a conseguir ser forte, porque é que a dor no meu peito era tão grande? Sentia os olhos inundados de lágrimas. Não os abri. Não iria deixar que ele me visse chorar. Nunca. Eu nunca lhe iria dar um gostinho desses.

No fundo, eu não podia amá-lo, era essa a verdade. Só pensar nisso era uma completa estupidez porque ele nunca me quereria dessa forma. E também… quem era eu para sonhar com uma vida feliz ao lado de alguém perfeito como ele?

- Diz o que queres de mim. – Disse ele, encostando os lábios aos meus. – Diz se tens alguém melhor, se queres melhor. Eu vou perceber, Mall. Mas isso não me fará desistir de ti.

Não respondi. Só a simples hipótese de eu ter alguém… Era estúpida por si só. Eu não tinha ninguém, não valia o suficiente para pertencer a alguém. A um só.

Não consegui evitar que as lágrimas continuassem sem cair. Empurrei-o mal senti os vestígios delas e virei-me na cama, sentindo-o afastar-se de novo. Suspirou. Mas não me tocou mais.

- Eu vou estar aqui quando quiseres olhar para mim e dizeres que não sou bom para ti.

Continuei calada. Como é que ele conseguia ser tão… tão inútil? Ele era perfeito, era tudo o que eu queria, o que eu não podia sonhar ter alguma vez. Ele era… tudo. Tudo para mim. Só que… eu não podia tê-lo. Ele merecia alguém… perfeito. Alguém à altura dele. Não eu. Eu era tudo menos isso.

- Eu vou esperar. Quando me deixares ver o teu sorriso sendo eu a causa dele, eu vou embora.

Definitivamente, ele não compreendia. Nem nunca iria compreender. Nunca.

Abracei mais a almofada como uma criança pequena, controlando-me para não soluçar. Eu queria chorar. Mas não podia. Não ali e não naquele instante. Não com ele. Não seria justo para mim. Mas… a vida não era justa, ou era?

- “You’ll be my queen… I’ll be your king… and I’ll be your lover too… yes I will… and so I come to be the one… who’s always standing next to you.”

Aquela voz… ao ouvi-la, fechei os olhos deixando de segurar as lágrimas. Chorei. Ele… estava a cantar… para mim? Não. Não podia, mas… porquê?

- Eu sei que canto mal mas… só o fiz porque… queria ver-te sorrir.

Suspirou. As minhas costas arrepiaram-se quando os dedos dele traçaram por elas uma linha calma, suave, leve. Arrepiei-me. O seu toque sabia bem…

- Se quiseres ficar sem me falar a noite toda eu fico aqui até ser dia. Esta cama é confortável. A tua presença é boa. Sinto-me bem aqui.

Ele continuava a desenhar nas minhas costas quase nuas… eu sentia apenas aqueles seus movimentos na minha pele, sem o afastar. Os meus olhos mantinham-se fechados, apreciando o carinho. Senti os seus dedos descerem pelas curvas do meu corpo, parando ao início do meu rabo para que toda a sua mão se pousasse sobre a minha pele. Tremi.

- Eu gosto da tua pele. É incrivelmente macia, é suave. Faz-me lembrar um bebé. Apesar de ser sensual como o inferno. E depois… tem o teu cheiro. Eu amo o teu cheiro. É como uma droga que… quanto mais eu tenho mais quero.

Fechei os olhos, limitando-me a ouvi-lo.

- Eu gosto da tua voz. É doce… e sedutora. E o teu sorriso. Eu só o vi uma vez, mas não há nada que eu goste mais. Além dos teus olhos. Eu vejo o quanto és… frágil através dele. Eu gosto que olhes para mim. Adoro. Mas agora… não o fazes mais.

Acabei por desistir. Virei-me para ele, olhando-o de relance. Queria apenas que ele me acolhesse nos seus braços, que me deixasse descansar no calor do seu corpo. Que me desse uma chance de… ser… a Allison. Não a Mallory.

Ele sorriu. A sua mão tocou na minha bochecha, secando as minhas lágrimas.

- Eu só quero que confies em mim. Não sou como os outros homens a que te habituaste. Não sou. Não vês isso?

Deixei-me encostar a cabeça ao peito dele. Só… só queria os carinhos dele. Mesmo que durasse pouco, que depois acabasse. Só… queria saber como era ser… tratada como… como se eu fosse especial. Apesar de saber que não o era.

Senti-o abraçar-me mais, puxando-me para si.

- Eu não vou sair daqui até te ouvir dizer alguma coisa que não seja insultar-me ou mandar-me dar uma curva.

Fiquei calada. O abraço dele sabia bem…

- Mallory? – Ele afastou-se de repente, fazendo com que eu sentisse os seus olhos presos em mim. – Eu… posso pagar para te ter em minha casa? Esta noite?

Continuei quieta. Na verdade, não sabia bem o que dizer. Ele não podia estar a falar a sério. Eu não queria ter de dormir na boate nem na rua mas… só de pensar em ficar na casa dele… eu? Na sua casa? Mas… porquê?

- Hum? Posso? – Insistiu ele. – Ou melhor… queres? Eu não quero abusar. Percebo se tiveres alguém à tua espera e…

De novo aquela conversa… ele era… tão tonto. Porquê?

Encostei a cabeça ao seu peito, escondendo a cara. Esperava que ele percebesse o que eu queria dizer com aquele gesto. Que não havia ninguém à minha espera, que ele era… o único que se importava comigo. Com o que eu sentia ou não. O único que eu… amava.

- Queres ir? Eu não te quero obrigar a nada…

Aninhei-me mais ao seu peito sem dizer nada. Quando o fiz… ele pareceu… sorrir. Ele… percebera finalmente que… eu daria tudo para que me tirasse daquele lugar?

- Queres ir comigo, não é? Posso levar esse silêncio e esse abraço como um sim?

Não respondi. Limitei-me a agarrar o tecido da sua camisola como se não quisesse que ele saísse dali sem mim. E não queria. Essa era a verdade.

- Como é que eu faço para te tirar daqui? – Perguntou-me. – Tenho que pagar o quê? Quando?

Mas eu continuei sem dizer uma palavra, não tirando a cabeça do aconchego do seu peito. Só conseguia chorar. Muito. Como nunca fizera antes. Eu precisava de chorar. Até não aguentar mais.

Ele suspirou.

- Vamos. Eu não quero saber de mais nada agora. – Disse, levantando-se e puxando o seu corpo consigo. Deixei-me simplesmente ir com ele. Sem forças… Senti, sem reacção, enquanto ele me secava as lágrimas com o polegar. Aproximou-se depois, encostando os nossos lábios. E eu deixei. Permiti que ele me beijasse. Estava farta de o mandar embora. Só queria carinho. Só queria esquecer que não merecia nada nesta merda de vida.

Vi-o afastar-se, com um suspiro. Abriu a porta e pegou na minha mão, saindo.

- Espero não ser preso por te raptar.

***

Subimos até ao 3º piso daquele prédio. Eu permanecia imóvel, ignorando o ambiente. Não era nada de estrondoso, nada de pomposo. Aquele lugar tinha aspecto de ser tudo menos um local importante e cheio de gente fina. Pelo contrário.

As ruas limpas lá fora disfarçavam o fedor que se sentia ao passar à entrada de algumas das portas daquele edifício. Havia um cheiro eminente a álcool ali, a tabaco, a todo o tipo de coisas que eu pensava existir apenas no meu meio. Mas afinal… o sítio de onde ele vinha não era assim tão diferente do meu.

Vi-o abrir a porta, deixando ver a figura de um outro homem deitado no chão da sala, rodeado de garrafas de cerveja. Resisti ao impulso de olhar em volta, sem me mexer.

- Amanhã eu mostro-te a casa toda… não sei se é seguro de encontrar alguma mulher por aí agora. – Riu.

Não imitei este gesto. Sem a mínima vontade de rir, limitei-me a ir atrás dele. Os meus passos seguiam apenas os seus. Permaneci calada, ainda no mesmo estado imóvel como um bicho de estimação assustado que chega à casa do novo dono pela primeira vez.

Quando ele me olhou… Tive vontade de o abraçar novamente.

- Não é aqui que eu vivo… – Confessou ele. – Eu só não te levei a minha casa porque o meu pai está lá e… não é alguém muito interessante. Gostas? Não é nada de mais mas… eu ajudei o gajo bêbado que está na sala a comprar este apartamento, portanto…

Sorriu-me. Eu fiquei sem dizer nada. Apenas o abracei forte. Senti quando ele me apertou contra si.

- Diz alguma coisa, por favor. Diz se estou certo ou errado… por favor.

- Deixa-me ficar contigo. Só hoje… – Pedi baixinho. Eu precisava… dele. Só dele. Dos carinhos dele. Do amor dele. Só uma vez. Queria… sentir-me… amada. Só isso.

- Eu deixo. Eu quero ficar contigo. Hoje. Amanhã. Depois. Enquanto quiseres que eu fique. E quando não o quiseres… eu faço-te querer.

Forcei-me a mim mesma a abraçá-lo mais. A sua cabeça pousou-se no meu ombro. Ouvi o seu suspiro. Precisava tanto daquele abraço dele…

- Obrigado por me deixares ver além da tua capa.

Deixei-me estar assim nos seus braços. Sabia tão bem… era bom demais. Nunca tinha imaginado que fosse tão bom ser acarinhada assim por um homem. Ainda mais um tão… perfeito como ele.

- Quero saber tudo de ti. Tudo. Quando achares que o mereço, diz-me…

Aquele abraço protector dele… era tudo o que eu queria.

Não disse nada durante os minutos seguintes. Quando me afastei, falei em voz baixa.

- Beija-me. Por favor.

Gostava tanto quando ele o fazia. Quando me abraçava. Quando os seus lábios tomavam os meus. Quando as suas mãos me tocavam. Os meus olhos fechavam-se enquanto as nossas bocas se tocavam… enquanto se deliciavam com o sabor uma da outra… raios partam, eu nunca tinha dado um beijo tão bom na minha vida. Nunca devorara uma boca tão boa como aquela. Nunca. O que é que se estava a passar comigo? Desde quando aquelas coisas me importavam?

Deixei que a sua boca continuasse a tomar a minha. Intensa. Fogosa. Louca. Mas simultaneamente carinhosa. Terna. E… romântica. Quem era eu, afinal? Porque é que eu não podia ser a Allison para sempre?

Ele afastou-se o suficiente para me olhar, ofegante.

- O teu beijo é tão… diferente… eu…

- Schh… não… não digas nada…

Pus a mão sobre os seus lábios para o impedir de falar e beijei-o daquela forma suave, de novo. Eu queria ser a Allison. Queria ser ela. Não a Mallory.

Tremi quando ele me abraçou. Acariciou os meus lábios, deixando que as nossas línguas se tocassem depois, em movimentos lentos. Carinhosos. Porque é que eu me sentia tão estranha, porque é que o meu coração batia tão acelerado? Porque é que aquele homem me deixava desesperada só com a ideia de ir embora, de me deixar? Eu nem sabia o seu nome… e mesmo assim… ele fazia-me sentir coisas que nunca nenhum outro fizera antes…

Pegou-me ao colo. Sem afastar os nossos lábios. Levou-me até à cama e pousou-me com cuidado no colchão, antes de se deitar a meu lado ainda a beijar-me. Não afastei aquela boca da minha. Aos poucos, fui deixando que a minha mão procurasse a sua, como que em busca de segurança. Entrelacei os nossos dedos sem cessar o nosso beijo. A sua mão apertou a minha, os seus lábios tocando os meus com suavidade. Deixei-me ficar só a senti-los. A sentir aqueles beijos. Sabia bem ser amada assim… era naquele estado que se sentia uma mulher quando… quando lhe davam tudo daquela forma?

Quando ele beijou o meu pescoço, cerrei mais os olhos. Mordi o lábio, respirei fundo. Ignorei o desejo. Eu queria que fosse diferente com ele… não queria apenas sexo mas… queria amor. Se é que algum dia saberia o que era isso. Porque eu não merecia sabê-lo. Não queria gemer como louca, não queria tornar aquilo animalesco. Ele merecia mais do que isso.

- Eu não quero nada que tu não queiras. Eu respeito-te. Queres dormir? Eu fico aqui a ver-te.

Aquele sorriso dele… era lindo. Eu amava simplesmente quando ele sorria. Quando me sorria.

Suspirei antes de me virar na cama, mantendo-me perto dele. Queria que ele me abraçasse, queria estar com ele como os casais apaixonados estavam nos filmes. Queria… por uma vez na vida saber como era estar assim com alguém. Mesmo que tudo fosse uma mentira e só durasse uma noite. Os seus braços atravessaram a minha cintura, colando os nossos corpos.

- Diz-me só uma coisa… Mallory não é mesmo o teu nome, estou certo? – Sussurrou contra o meu ouvido. Os meus olhos fecharam-se, ao de leve. Senti-me só no aconchego dos seus braços antes de responder…

- Allison…

- Combina com o meu. Tyler e Allison. Fica bem. Agora dorme. Eu vou estar aqui quando acordares.

Beijou-me na cabeça. Eu sorri. Tyler… então… era esse o nome dele. Tyler… combinava com ele. Também era muito bonito. Fechei os olhos, aconchegando-me mais nos seus braços.

- Obrigada por tudo… Tyler.

- Dorme.

A música que saía da sua voz voltou a inundar os meus ouvidos. O seu abraço tornou-se mais apertado, como que se não quisesse deixar-me fugir.

-“I’ll be your man, I’ll understand and do my best, to take good care of you. Yes… I will...”

Ouvir aquela voz acalmava-me. Puxava-me do meu abismo. Impedia-me de cair. Isso… importava mais do que qualquer dinheiro do mundo. Ele era o meu herói. Nem que fosse apenas por aquele tempo. E eu ia deixar que ele o fosse, sem contestar.

Não disse mais nada. Deixei que os meus olhos se fechassem…

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